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quinta-feira, 12 de outubro de 2017

ALVARENGA

[Carijós - Morro do Chapéu - Este foi dos primeiros do lugar - Desde 1743 já  pagava impostos em Carijós e tinha escravos]

DOMINGOS GALVÃO, Alferes.
Em 1757. Sesmaria na freguesia dos Carijós. Fazenda com engenho, que havia comprado de Domingos Alvarenga.
Códice da S. G. 119,fs.3
Á família Alvarenga era da nobreza paulIs e Galvão era tronco da mesma.
Em 1820, BERNARDA EUZEBIA DO SACRAMENTO, viúva do capitão Joaquim Pinto Ribeiro, vendeu a Felisberto Virgulino Martins Pereira, terras havidas por meiação de seu marido falecido. (Texto nulo)

1754.Em Carijós foi batizado Antônio, filho de André Pereira Furtado e Margarida de Oliveira Neves; neto paterno de Manuel Gomes e Catarina Furtado; e materno de Manuel de Oliveira Neves e, de Andresa de Sousa. Foram Padrinhos: Miguel Francisco Vieira e Páscoa da; Ressurreição, esta mulher do al feres Domingos Galvão.
1816. Bernarda Euzebia do Sacramento, viúva do cap, Joaquim Pinto Ribeiro, o gr d.-mor José Moreira de Faria, este por cabeça de sua mulher Joaquina, filha de Joaquim Pinto Ribeiro, foram citados por Francisco" Antônio da Silva que disse haver sido contratado para administrador da fazenda do Alvarenga, pelo preço de 28 oitavas de ouro por ano, em 1S08, que só havia recebido o pagamento relativo a um ano.
1810. José Antônio da Silva, filho de José Antônio de Araújo, casou com Violante Maria de Jesus, filha de Belchior Ribeiro Pinto, na ermida do Alvarenga, do alferes Pinto Ribeiro. .
1743. Domingos Alvarenga figura em primeiro lugar na reunião dos moradores da freguesia de Carijós, havida na Matriz, para que se manda- se consertar a mesma, e que ficou resolvido pela importância de 4000 oitavas de ouro. FAZENDA DO ALVARENGA. Felisberto Virgulino Martins Pereira comprou a fazenda do Alvarenga a sua irmã Bernarda Euzebia do Sacramento. Essa fazenda se constituía de uma sesmaria de terras chamada Contrato e Pacheca, cuja fazenda partiam suas terras ao nascente com terras de Lauriano de Sousa Moreira, herdeiros de Floriana, pelo sul com  terras do Morro do Chapéu, pelo poente com terras de Jerônimo José Fernandes e herdeiros de José Cardoso Lima, (Buarque), com terras da fazenda1 do Zebrai e ao norte, com o lugar denominado Saco, com terras de Caetano Manuel de Meireles, Felisberto Virgulino vendeu essa fazenda em 4 de maio de 1835 para o major Joaquim Rodrigues Pereira.

PATRIMÔNIO DA FAZENDA DO ALVARENGA

1792 O Padre Manuel Vaz de Lima, por escritura, fez o distrato da compra que havia feito da fazenda do Alvarenga, da freguesia de Queluz; constante de uma sesmaria de meia légua de terras, que havia feito de Domingos Pereira dos Santos e sua mulher Francisca Maria do Espírito Santo, João Pereira de Lima e sua mulher Joaquina Francisca Antunes, e Manuel dos Anjos  Lima, todos moradores no Ribeirão do Melo, freguesia de Itaverava.
A fazenda do Alvarenga foi vendida a Domingos Galvão por Domingos Alvarenga, que a havia construído, com engenho, etc. E Domingos Galvão é que requer eu e alcançou carta de sesmaria da mesma.
1801. Maria da Costa Rodrigues, mãe de Joaquim Dias Ferreira, vendeu ao padre Joaquim Francisco Arruda capelão em Morro do Chapéu, terras que dividem com DISTRITO DE MORRO DO CHAPÉU o capitão José Alves de Oliveira, situadas na barra dos rios Piranga e Piranguinha.
Felisberto Virgolino Martins Pereira comprou a fazenda do Alvarenga de sua irmã i D. Bernarda Euzebia do Sacramento. Fazendo parte da compra também uma sesmaria no lugar denominado Contrato e buraco chamado Cachêta (ou Pacheco); cuja fazenda confrontava, ao nascente com terras de Laureano de Sousa Moreira, herdeiros de dona Floriana, ao sul com terras do Morro do Chapéu, ao poente, com terras de Jerônimo José Fernandes e herdeiros de José Cardoso Lima. (de Buarque, que foi o seu fundador) e com as do Zebrai; e ao norte com as de Saco e com as de Caetano Manuel de Meireles, Felisberto Virgolino vendeu essa fazenda, em 4 de maio de 1835, ao major Joaquim Rodrigues Pereira, pelo preço de quatro contos de reis.
1819. Bernarda Euzebia do Sacramento vendeu, a Felisberto Virgolino Martins Pereira terras na Fazenda do Alvarenga, que lhe pertencia como meeira do seu falecido marido capitão Joaquim Pinto Ribeiro. Preço 1:150$000. Bernarda era neta de Páscoa Maria da Ressurreição e irmã de Leonor Felistina e Joaquina Sebastiana.
1757. DOMINGOS GALVÃO, alferes, teve sesmaria na freguesia dos Carijós, fazenda com engenho, que havia comprado a Domingos Alvarenga. Livros. G. 119, fls. 3.
1802. O padre Manuel Vaz de Lima, morador na fazenda do Alvarenga, promoveu libelo contra João Ribeiro dos Santos, morador na fazenda dos Areias, em companhia de sua mãe. Dizendo haver plantado 4 alqueires de milho e 1/meio de arroz no lugar denominado São Pedro, da sua fazenda, e um cavalo russo de réu comeu o milho e o arroz, estragando tudo, estimando o milho em 54 carros, avaliando o alqueire de milho a 2 e meia oitava de ouro, somando 135 oitavas e o arroz em 72 oitavas. Demandaram... Joaquim Pinto Ribeiro foi abonador das custas do réu. Foram inquiridas testemunhas e avaliadores.
José Luís da Silva foi testemunha e disse ser natural da freguesia de São Miguel, e morador na aplicação de Santo Amaro. João Ribeiro dos Santos disse ser natural da aplicação de Morro do Chapéu, casado, com 36 anos, homem branco.
1796. O padre Manuel Vaz de Lima, morador na fazenda do Alvarenga, vendeu a Manuel de Melo Costa a fazenda Carandaí, cujas terras dividiam com as do mestre de campo Inácio Corrêa Pamplona, com Domingos da Costa Cunha, com a viúva de José Tavares de Meio e com o alferes Manuel Pereira de Azevedo. Constante de uma sesmaria.
Bento Gomes, casado em 17S8 em Atibaia, com Manuela Vaz, filha de Domingos Vaz de Lika e Mariana do Prado Siqueira, neto paterno de Manuel Vaz de Lima e de Luísa Pedroso. Neto materno de João Pinto Guedes e de Sebastiana do Prado.

Bento Gomes, casado em 1788, em Atibaia, com Manuela Vaz, da família Domingos Vaz de Lika, e de Mariana do Prado Siqueira. Neto paterno de Manuel Vaz de Lima e de Luisa Pedroso. Neto materno de João Pinto Guedes e de Sebastiana do Prado, Maria Leme foi casada com Gaspar Vaz de Lima, natural de Santos, filho de Manuel Vaz de Lima e Luisa Fernandes de Oliveira. Família natural de Lamego. Moradores em S. Paulo de outrora.

sábado, 29 de julho de 2017

VISITA A FAFE - SUGESTÕES PARA UM OLHAR

 Miguel Monteiro
Coordenador do Museu da Emigração
e das Comunidades (Fafe)





Nas caminhadas de hoje, as cidades perdem-se por entre imagens cinzentas dos novos objectos urbanos disformes, dos ruídos e dos fumos. Ao lado, ficam os lugares suaves e adormecidos do passado.
Por caminhos abandonados, repousam, ignorados, os pequenos recantos onde assenta a memória e a alma dos que os habitaram.
Relembre a antiga chegada a Fafe, pela velha ponte românica de Bouças e observe o que resta, em ruínas, da capela de Santo André, mesmo ao lado do que foi uma gafaria.
Lembre, deste modo, o tempo de uma caridade prestada aos que, por serem excluídos, recolhiam esmolas dos peregrinos, neste itinerário de assistência medieval.
No culto ao Santo, recorde o que foi a crença no mito da passagem e da importância dos barqueiros de almas que lhe surgem sempre junto às pontes, como a de São José, no Lombo.
Suba, vagarosamente, pela calçada de Bouças e Fafoa, sentindo em cada passo a caminhada dos peregrinos, como quem volta à Idade Média, em regressos do santuário da Nossa Senhora da Oliveira, onde D. João I também peregrinou, depois de Aljubarrota.
Ouvem-se, ainda, nas pedras gastas, o trote de cavalos senhoriais, com a obrigação de irem defender o castelo de Guimarães…
Veja o que foram as vénias em oração, nas alminhas do Senhor do Bonfim, com data de 1778 e reconheça o desenho do remate da Matriz de Fafe com data de 1779, como quem antecipa o projecto desta Igreja.
Olhe, ao lado, as casas de proprietário, como a de 1720, majestosas, junto àquela antiga via com dignidades pré-urbanas que foi a entrada na cidade, na rua Luís de Camões ou Rua da Baixa.
Surpreenda-se com a entrada na cidade. Nela ainda são visíveis alguns requintes arquitectónicos de uma cidade de porcelana e outros símbolos burgueses do século XIX, onde palácios, casas apalaçadas e palacetes estruturaram uma vila de “Brasileiros” de torna viagem.
Vá ao Jardim do Calvário. Sentir-se-á no altar silencioso de Fafe. Uma vez aí, tente percorrer, em círculo, as serras de Fafe, desenhando o território de Monte Longo.
Demore-se neste Jardim. Sentado num dos seus bancos, olhe a serra da Lameira e sentir-se-á num local sagrado de Mons Longus, numa desaparecida capela onde se rezaram ladaínhas demoradas, num resto do que foi uma terra airosa, que noutros tempos foi desenhada a ocres por emigrantes do Brasil.
Olhe a Praça 25 de Abril, local eleito para a representação de sonhos e suores equatoriais, de jardins e palmeiras que preencheram o antigo jardim da Queimada.
Delicie-se com a vitela assada, ancestral petisco de viajantes a cavalo que se dirigiam para o interior, nos trajectos que seguiam também para Castela, mas não ponha de lado o paladar das cavacas e pão de ló, como expressão de um luxo próprio de viajantes.
Suspenda a sua viagem na descoberta da rua da Baixa onde vielas lembram o que foi a primeira tentativa de configuração urbana local e não se esqueça das festas que em Julho acontecem em honra da Senhora de Antime. Nessa altura, mergulhará na magia máscula de uma festa realizada há milénios, e descobrirá um culto de masculinos dirigido ao senhor do Sol, que dá sentido à expressão: “eu para casar não precisei de carregar o andor da senhora de Antime!”.




. . . A PAISAGEM . . .

«Olhe, meu caro, esta boa terra de Fafe é assim: pão pão, queijo queijo - portugueza de lei, hospitaleira, franca até á rudeza e capaz também de pôr um bom cacete de cerquinho, a sua justiça d'eles, onde el-rei não haja posto a sua propria.
E é que a espada vai na burra, e nada por isso de contrariar a altaneira Fafe. Mas é de simpatizar, não é verdade?
Eu, de mim, quando ao regressar de Basto, em uma das excursões que fiz pela província, cheguei ao alto da Gandarella e avistei a larga bacia enflorada de esmeraldas, em que assenta a maior parte do concelho, paysagem onde a luz ri e a água brinca, tive a comprehensão desta alegria mascula e saudavel, deparando no valle extenso e nas montanhas rudes com o aspecto duma natureza, que é ao mesmo tempo uberrina e alegre, forte e expansiva. Ahí tem o homem explicado pelo meio.»[1]
A freguesia de Fafe situa-se na parte sul do concelho e ocupa uma área de 624, 49 (ha), para uma população de cerca de 15 000 habitantes, tendo passado pelo titulo de Vila antiga, estatuto de Julgado em 1835, Vila nova em 1840 e o de Cidade em 1986.
Os Rios Vizela e o Ferro correm aqui, fazendo, em parte dos seus trajectos, fronteira com as freguesias circunvizinhas. O primeiro, com as de Fornelos e Golães e o segundo, com as de Quinchães, Antime e Armil.
O rio Ferro recebe, já na freguesia, as águas da Ribeira de Ribeiros, da Ribeira de Moreira e da Ribeira das Ínsuas que, com o Vizela, irrigam alguns campos nos seus percursos ajustados às suas margens verdes.
As principais elevações existentes na freguesia - Calvário, 356 m; Castelhão, 360 m; Santo Ovídio, 332 m; São Gemil, 401 m; Freiras, 427 m; Pardelhas, 420 m; Cumieira, 371 m - constroem um relevo de baixa altitude, de onde se podem observar as ribeiras e a riqueza da sua vegetação.
A freguesia de Fafe apresenta os últimos sinais do rural e agrícola nos lugares de Bouças, Agrela, Pardelhas, Sá e Calvelos onde existe maior capacidade de rega dos campos, dada a proximidade daqueles ribeiros.
Aqui se organizaram alguns dos mais antigos conjuntos agrícolas, que caracterizam o período pré-urbano, tendo resistido, como ambientes rústicos, quase até aos nossos dias.
Vá e veja ainda sinais de ruralidade às portas da cidade ou compare-a com uma antiga descrição:
"É bem formosa a estrada de Felgueiras, [...]. Imagine a paysagem iluminada pelo sol de um fresco dia de abril .
Deixe as ultimas casas de Fafe, a estrada desce, as macieiras em flôr cortam, como um sorriso alegre, o verde escuro dos outeiros, e o claro esmeralda das campinas.
Ahí tem, sobre uma elevação, a pequenina capella de São José e logo abaixo, quando a ponte nova salta sobre um affluente do Vizella, as aguas, que se despenham tremulas, em uma cascata formosa, os olmeiros subindo ao alto, os penedos cobertos de vegetação similhando ilhotas em agrupações tão artisticas, que a gente tem vontade de as metter na mala para adornar com elas a nossa habitação na cidade. "[2]

Procure os lugares rurais da freguesia, começando por Agrela e reconheça no topónimo Ager ou Agra sinais do que foi a romanização.
Visite Bouças, Chã de Bouças, Fafoa, Tojal, Fojo, Crasto, Moínhos da Ponte, Pardelhas, Ponte da Ranha, Calvelos e constatará o quanto Fafe tem de rural em cada um destes lugares, numa acelerada transformação urbanizadora.
Descubra os esquecidos lugares que a cidade integrou, tais como: Devesinha, Cumieira, Corredoura, Assento, Portugal, Ponte Nova, Santo, São Gemil, Seara, Travessa Nova, Fafe.
O local onde se desenvolveu o actual centro cívico de Fafe corresponde à encosta de uma pequena elevação transformada nos finais do século XIX em Jardim Público, assemelhando-se a sua morfologia ao monte de Santo Ovídio.
A cidade desenvolveu-se na envolvência do outeiro (altarium) do Calvário e, mais recentemente, nas vertentes do monte do São Jorge, Cumieira e Castelhão, locais onde existem leves indícios de ocupação primitiva.
A elevação do outeiro do Calvário apresentava, no declive Este-Oeste, uma paisagem aberta e árida, onde a estêva predominava, sendo por isso chamada de Vale de Estevas, e actualmente vulgarizada pela designação de Bal de Estêbo.

Neste lugar existiu uma hospedaria, à qual Camilo Castelo Branco se referiu, chamando-lhe o botequim da terra, onde os homens de Fafe jogavam o dominó e a sueca.

. . . O PASSADO. . .


O passado não se representa aqui em grandiosos monumentos, mas em materialidades simbólicas sóbrias, dispersas, ameaçadas e algumas desaparecidas.
Olhemos velhos sítios onde estes vestígios nos relembram vivências culturais ignoradas…
Nos montes de São Jorge e da Cumieira, mamoas confirmam a presença de povos muito antigos, ligados a uma primitiva vida agro-pastoril, que fizeram das suas sepulturas os símbolos da perenidade e de engrandecimento da sua existência.
Não deixe de ir ao lugar designado por Monte das Freiras, como topónimo que remete para lendas, como a hipotética existência de um mosteiro feminino que a História não confirma. Contudo, aí encontrará os vestígios de construções, as quais dariam trabalho aos arqueólogos e, a si, uma das melhor das vistas das terras de Monte Longo.
Mais abaixo, uma visita ao Castro de Santo Ovídio oferece-lhe a possibilidade de conhecer um povoado do Séc. I a.C. com demonstrados contactos com os Romanos invasores e que a Unidade de Arquiologia da Universidade de Minho tem como objecto de estudo.
Dos seus habitantes restaram um conjunto de vestígios materiais que se encontram no Museu D. Diogo de Sousa e uma estátua de Guerreiro Luso-Galaico, que aí foi encontrada em 1870, quando se faziam os alicerces da Capela de Santo Ovídio, e que foi adquirida em 1876 pela Sociedade Martins Sarmento, onde ainda hoje se encontra.
Com a apropriação do vale, durante a romanização e Alta Idade Média, surgiram os povoados ribeirinhos, tendo os seus habitantes encontrado refúgio temporário no monte de Castelhão e São Jorge, onde construíram provisórias fortificações em tempo de grande instabilidade administrativa.
Da Baixa Idade Média temos as primeiras e documentadas notícias de mosteiros e senhores que tutelaram o povoamento e administração local: do Mosteiro de Antime de 1120 e de um outro, no lugar da Matriz, fundado por um fidalgo de apelido "Fafez" com solar situado nas proximidades, que foi extinto para se unir ao de Santa Marinha da Costa, passando a ser tutelado por esta entidade religiosa e senhorial.
«Santa Eulália, foi Mosteiro, não alcançamos de que Ordem, entendemos que foi fundado por algum fidalgo dos do apelido Fafez; porque dizem ser este o solar desta família, e que daqui foi senhor Dom Godinho Fafes, filho de Dom Fafes Luz, Rico homem, e Alferes do Conde Dom Henrique, e que esta Vila, e Freguesia tomaram dele o nome: extinguiu-se não sabemo quando, e uniu-se ao Mosteiro de São Martinho da Costa, que nele apresenta Cura, com noventa mil Réis de rende, e para os Frades Jerónimos com sabidos mil cruzados. Tem esta freguesia cento e cinquenta vizinhos, e nela há excelente pedra para edifícios.»[3]
O Mosteiro da Costa, ao absorver este mosteiro e outros, nomeadamente o de Santa Maria de Antime, apropriou-se dos seus bens e passou a nomear o responsável religioso. Deste modo era atribuição sua receber as correspondentes contribuições provenientes da população:
«Em 9 de Abril de 1437, Frei Diogo Martins assumiu as funções de capelão e vigário de Santa Vaia Antiga, na actual Vila de Fafe, para que tinha sido apresentado pelo prior e todo o convento da Costa. É de notar que esta igreja estava aforada a Inês Gomes, pesando sobre ela a obrigação de lhe dar ‘de comer segundo que he contheudo em prazo’.
Por não serem abundantes as notícias sobre o estipêndio anual recebido pelos clérigos, consideramos oportuno informar que, além do que Inês Gomes tinha de lhe dar como alimentação, receberia ainda: 30 libras de moeda antiga; 20 teigas de trigo, tiradas ‘do trigo que o dicto prior e convento aviam d'aver da dicta egreja’; ficando ao seu dispor a casa maior da dita igreja, cujas reparações necessárias corriam por conta de Frei Diogo Martins ou Inês Gomes.» [4]
Terá sido fundador do Mosteiro de Santa Eulália e senhor do solar, D. Fafes (Godins), o Luz, (de Lanhoso) «bom rico homem e alferes do Conde D. Henrique», filho de D.Godinho Fafes, (de Lanhoso), «o que edificou Fonte de Arcada, e a coutou» e neto de D. Fafes Serracins, de Lanhoso « De onde vem os Godinhos que vem do nobilíssimo sangue dos Godos», conde e «bom rico homem, e morreu com grão peça de cavaleiros quando lidou el rey D. Garcia de Portugal com el rey D. Sancho (II) de Castela».
Na descendência dos Fafes, encontramos ainda, no Livro Antigo de Linhagens, duas personagens ilustres: «(D. Ermígio Fafes, (de Lanhoso), abade de Refojos de Basto; D. Egas Fafes, (de Lanhoso), arcediago de Braga em 1245, bispo de Coimbra» (1247-1267) e arcebispo eleito de Santiago de Compostela (18/12/1267). Este D. Egas Fafes morreu em Montpellieu, encontrando-se sepultado em túmulo com estátua jacente, na Capela de Santa Clara, da Sé Velha de Coimbra, que ele mandara construir.
Os cavaleiros e os homens livres da terra de Monte Longo tinham honra e privilégio de defesa do Castelo e da Vila de Guimarães:
“Privilégio delRey Dom Joaõ o Primeiro, em que manda que os moradores da Villa de Celorico de Basto, & Monte Longo venhaõ velar, & guardar a esta Villa, quando for tempo, & necessário no anno de 1423. está confirmado por ElRey Dom Joaõ Terceiro anno de 1529. & já d'antes destes Reys o tinha concedido ElRey Dom Diniz, & disto ha sentenças nom Cartório, & assim as justiças de Guimarães os compelliraõ a isso»[5]
Por outro lado, os túmulos existentes no interior da Igreja Matriz de Fafe testemunham a sepultura destes cavaleiros laicos ou religiosos da Baixa Idade Média, como os mais antigos testemunhos de que Fafe era um local onde residiam Senhores que tutelavam a administração Medieval local.
O topónimo "Concelho" existente nas proximidades da Igreja Matriz leva-nos a supor que este sítio corresponderia ao local físico e simbólico da administração local medieval, sem Domus Municipalis, que o Foral Novo, concedido por D. Manuel em 1513, prescreve para o Concelho de Monte Longo.
Estaríamos, assim, perante um território concelhio constituído por várias freguesias, tendo a de Fafe a preponderância de cabeça de um Concelho, cujo território se demarcava pelos rios Bugio e Vizela.



...Estrutura Viária


O desenvolvimento da freguesia de Fafe terá sido determinado pela existência de uma documentada via medieval que ligava Guimarães a Cavês, marcada pelas pontes românicas, no lugar de Bouças, e da Ranha, no lugar com o mesmo nome, em Fafe.
Esta via foi um dos mais importantes trajectos durante o império Romano. Bastante seguido era, também, o caminho que ia por Guimarães, Cavês, Valpaços e Bragança. No quadro dos itinerários, tinha menos vulto o que ia de Braga a Chaves e daí a Bragança, do que o que passava por Fafe.
O trajecto seguia nas proximidades do Castro romanizado de Santo Ovídio, situado na freguesia de Fafe e do Castro da Subidade, este já na freguesia de São Gens, com evidente serventia para o Império Romano.
Este sentido de ligação do litoral ao interior manteve-se até aos nosso dias, tendo na Idade Média significado especial, no contexto dos itinerários das peregrinações. A sua função revelou-se fundamental na ligação do Litoral ao Interior e de Portugal às Terras de Espanha.
As vias medievais eram ainda os caminhos que ligavam as povoações, vilas e cidades, o que justifica a localização de outras vias românicas assinaladas pelas pontes do Barroco, em Golães; do Lombo, em Antime; da Ranha em Fafe.
Ao mesmo tempo, muitos daqueles locais foram centros de peregrinação e, dada a localização de Fafe, por aqui se faria a passagem obrigatória de almocreves, viajantes, peregrinos, mercadores e feirantes.
Esta via é referida como o local onde se encontrava, no lugar de Bouças, uma gafaria «muito nomeada nos meados do século XIII».[6] No mesmo lugar, existe uma capela da segunda metade do Século XVIII, votiva de Santo André.
As fachadas da Capela de Santo André e das alminhas do Senhor do Bonfim, datadas de 1778 e localizadas no mesmo trajecto, anunciam o que veio a ser a fachada da Igreja Matriz, construída em 1779.
Situada exactamente no termo da Monte Longo e Guimarães, precisamente junto à ponte de Bouças, a gafaria permitia aos leprosos sustentar-se das esmolas dos peregrinos que se dirigiam so Santuário de Nossa Senhora da Oliveira. Relembremos que D. João I, em 1385, após a vitória sobre os Castelhanos, em Aljubarrota, veio em peregrinação a Santa Maria da Oliveira.
A especial localização da freguesia de Santa Eulália Antiga de Fafe, no que foi o contexto geo-espacial da Idade Média, determinou, naturalmente, para esta localidade, uma progressiva importância, dado que um elevado número de mosteiros tinha assento nas suas proximidades: São Gens de Montelongo (século XI), Santa Maria de Antime (1120), Mosteiro de Várzea Cova (1131), São Salvador de Fonte Arcada (século XI), São João Baptista de Arnoia (1176), Santa Maria de Pombeiro (1059), São Miguel de Refojos de Basto (1131), São Salvador de Roças (século XI), Mosteiro de Guimarães (957), Santa Maria da Oliveira (1033), São Pedro de Cerzedelo (Lanhoso) (1059), São Martinho de Caramos (1090), Santa Marinha da Costa (século XI), São Torcato (1052). [7]
Estas importantes congregações religiosas, sendo possuidoras de uma grandiosa população residente, eram também Senhores de grande número de propriedades.
Ao mesmo tempo, muito destes locais eram centros de peregrinação, pelo que, tudo conjugado, Fafe se tornava um local obrigatório de passagem de pessoas e mercadorias.
Por isso, este local ganha, com o tempo, um valor de registo, nomeadamente a construção de pontes medievais ou dos inícios da Idade Moderna.


. . . O SENHORIAL . . .


No século XVIII, as Casas do Santo e a Casa dos Azevedos tomam as proporções que actualmente se lhes conhece, num período de expansão senhorial, surgindo outras de menor importância social e económica, implantadas nas áreas mais férteis da freguesia.
A zona do Assento e Matriz vai perdendo significado social e político, quer para as populações concelhias, quer para a população da freguesia, sendo substituída, nessa função, pela rua que actualmente integra a Praça 25 de Abril, emergindo como local com “uma só rua”, onde estava a Casa da Câmara e a Cadeia.
Fafe é, nessa altura, o local de passagem obrigatória da aristocracia rural com assento principal nas Terras de Basto, bem como dos primeiros que deram notícia das riquezas do Brasil e as casas brasonadas, em número muito reduzido, constituem um indicador da pequena dimensão do território agrícola local.
A Casa dos Condes de Azevedo, localizada no lugar de Calvelos, tem as características arquitectónicas de um edifício do Séc. XVIII, com um brasão da época, implantado na fachada da capela, por cima da padieira, constituindo esta parte da casa aquela que possui maior imponência no conjunto do edifício.
A Casa do Santo Velho, construida no séc. XVII, com elementos também do XVIII, pertence já à actual área urbana, integrando a zona agrícola outrora existente na vertente Norte e Noroeste do Monte de São Jorge.
Localizada na Avenida das Forças Armadas, apresenta três elementos distintos: a casa do século XVIII, bastante sóbria nas dimensões; um portão que se destaca do conjunto, com grande beleza e imponência, onde se integra um brasão do século XIX; uma capela, da primeira década do século XX, ajustada lateralmente ao edifício.
Estes senhores rurais, detentores de novos privilégios mercantis e de fartos rendimentos, procuraram nas viagens uma das formas de afirmação do seu poder económico e social, encontrando aqui o local de repouso da viagem que os leva ao litoral ou aos parentes, em viagens demoradas de cortesia, sempre acompanhados de criadagem.






. . . AS RUAS DA CIDADE . . .
 

No concelho de Fafe, a freguesia de Santa Eulália de Fafe reunia condições de edificação de uma urbe, uma vez que se localizava num local que era já um espaço administrativo, onde se situava a sede de concelho e por onde se processava passagem de pessoas e mercadoriais do Interior-Litoral.
Assim, a cidade, no séc.XIX, foi o produto da afirmação política do liberalismo e das condicionantes económicas, sociais e políticas, com reflexos na expansão económica verificada na segunda metade do século.
Simultaneamente, o sucesso dos nossos emigrantes no Brasil levou-os a edificarem neste local as suas habitações, definindo uma estrutura urbana de novas ruas e praças, à imagem das que conheceram do outro lado do Atlântico e que lhes deu a fortuna.
Deste modo, num sítio onde havia uma só rua que ligava Guimarães a Cavês, os «brasileiros» implantam praças e pracetas, introduzindo na cidade todas as componentes caracterizadoras da vivência social burguesa e capitalista.
É assim que a sua Casa, o Clube, o Teatro, o Passeio Público surgem como símbolos do seu poder e estatuto económico e social. Ao mesmo tempo, os avultados investimentos que fizeram na aquisição de quintas e na indústria têxtil confirmam estes burgueses como um novo grupo social de grande prestígio local.
Paralelamente, por sua exclusiva iniciativa, fazem inserir no espaço urbano outras representações simbólicas da vivência burguesa que se afirma através dos actos de filantropia, tais como a construção dos Asilos de Inválidos, da Infância Desvalida e do Hospital de São José.
Esta atitude surge como uma novo comportamento social, oposto às tradicionais relações de solidariedade comunitária tradicional, tipicamente agrária, de onde eram provenientes, e através da qual os «brasileiros» se distinguem e afirmam como parte de uma nova classe social: a burguesia.
Simultaneamente, participam na criação das primeiras agremiações de interesse social, nomeadamente a Irmandade de São José, administradora do Hospital e Bombeiros Voluntários, bem como dispensam grandes donativos para a construção da Igreja Nova de São José.
O Clube Fafense e o Cine -Teatro completam, na época, os elementos de cultura necessários a este grupo social formado por emigrantes do Brasil, que se destacaram do conjunto da população rural local.
A Companhia de Fiação e Tecidos de Fafe (Fábrica do Ferro), fundada em 1886 e a Fábrica Têxtil do Bugio, fundada em 1873, funcionaram como atractivos de população e quadros para a Vila, sendo da sua iniciativa a construção dos Bairros operários de Antime e de São José, no conjunto de outras iniciativas de carácter social ligadas aos liberalismo económico.
A Fábrica Fafense de Gasosas, Refrigerantes e Laranjadas - Santo Ovídio (c.1918) e a Fábrica de Papel (c.1930), em Cavadas, corporizaram ainda as iniciativas industriais mais significativas.
Por seu turno, a Praça da Feira Velha adquire, nesta altura, uma configuração ortogonal e estrutura-se a Praça José Florêncio Soares, onde vão surgir o Hospital, a Igreja Nova de São José e a Cadeia.
Constrói-se o Jardim Público (1892) e abrem-se as ruas a ele adjacentes, onde vão surgir edifícios particulares.
A construção do Caminho de Ferro e Estação, em 1907 e a abertura da Rua 5 de Outubro, obrigando à demolição da capela de Santa Luzia, localizada na entrada da rua, complementam as vias estruturantes da vila do século XIX, as quais se mantêm até à primeira metade deste século.
A actual Praça 25 de Abril vê surgir, em 1838, o Cais da Arcada, sendo libertada, em 1912, de um conjunto de edifícios públicos e particulares aí existentes, desde o século XVIII e inícios do XIX.
Estes imóveis, perturbando a ideia de um espaço cívico, que se desejava espaçoso e burguês, são demolidos para dar lugar à actual Praça central de Fafe, construindo-se um novo edifício para a Câmara Municipal (1913), na Avenida 5 de Outubro.
Nestas ruas, praças e pracetas são implantados os equipamentos públicos, sociais e culturais necessários à urbe.
A cidade criada pela sua localização de passagem ou ligação ao interior, adquire uma função turística, em tempo de capitalismo burguês, com a construção de um elevado número de hotéis e hospedarias.
Nos finais deste século, integradas na política de desenvolvimento viário designada por Fontismo, foram construídas as pontes novas de São José, da Ranha e de Golães, desviando os acessos à cidade.

Mas Fafe é, ainda hoje, um local de passagem com destinos que ligam o litoral à Europa.

. . . OS JARDINS E PARQUES . . .


O mais antigo Jardim de Fafe, provavelmente do século XVIII, situa-se na cerca do Solar do Santo Velho, em muito mau estado de conservação. Sucede no tempo o Passeio Público do séc. XIX, reservado à burguesia liberal, cujo processo de construção consta de 1890, no lugar do Calvário. Inaugurado em 1892, deve-se a sua existência à filantropia do Comendador Albino de Oliveira Guimarães, um "brasileiro" de Fafe, personalidade hoje ignorada pelos locais.
Este Passeio Público era frequentado pela burguesia, constituindo local obrigatório de visita, tendo recebido todos os elementos decorativos para cumprir o espírito do romantismo da época: um lago, ainda que pequeno, onde é colocado um pequeno barco trazido da Povoa do Varzim; um coreto; um ringue e, para além das necessárias árvores, uma ponte recreando um ambiente exótico e romântico.
Restaurado em Abril de 1993, mantém as características iniciais e merece, só por si, uma visita.
No séc.XX, os jardins passam a cumprir uma nova função ideológica e social, sendo, tal como o já desaparecido jardim da Queimada, desprovidos de gradeamento, para que o acesso e fruição se tornem possíveis a todas as classes sociais.

Dê uma olhadela ao designado Parque da Cidade no monte de São Gemil, também denominado Cidade Porto Seguro, onde foram plantadas um conjunto de árvores sem qualquer critério de escolha. Daqui, poderá ter uma das mais belas vistas da cidade e das encostas da cadeia montanhosa que circunda o Concelho (Monte Longo), onde assenta a maior parte das freguesias.

. . . RELIGIOSO . . .


A cultura de um povo mistura-se com a sua atitude religiosa, de tal modo que uma poderá ser vista, através da outra.
No século XVIII, a Igreja de Fafe sofre uma profunda remodelação, conforme o gosto da época, certamente devido ao ouro do Brasil, como aconteceu, de resto, em todo o norte do País.
Contam-se ainda na freguesia de Fafe, como principais referências religiosas do século XVIII, XIX e primeira década do séc. XX, a Igreja Nova de São José; a capela de Santo Ovídio, situada no Outeiro do Castro; a capela de São José no lugar de São José; a de São Pedro em Pardelhas; as capelas particulares do Senhor do Porto, integrada na Casa do Paço (lugar do Barroco), propriedade de Dona Maria da Luz Bettencourt Vasconcelos Correia e Ávila, Condessa de Paço Vieira; a capela de Nossa Senhora do Carmo, integrada na Casa Brasonada do Santo Velho, propriedade de Manuel Maria de Brito Ferrari de Almeida e seu irmão António Manuel e a capela particular de São Bento, integrada na Casa Brasonada dos condes de Azevedo, tendo sido um dos seus últimos proprietários, Estevão Maria de Barbosa Carneiro de Queiroz de Azevedo e Borbom.
As capelas particulares que apresentam a fachada principal virada para o exterior e se encontram ajustadas ao corpo do edifício residencial dos seus proprietários (sinal de que na família tinha havido um padre e que este prestava serviço religioso também aos não familiares) encontram-se hoje, na sua maioria, em ruínas ou encerradas ao público.
E dado que, de algum modo, todos os Fafenses passaram por elas, merecem também uma particular atenção as Alminhas localizadas nos lugares: Assento, rua Cidade de Guimarães, Bouças, Ranha, Cumieira.
Estas Alminhas, lugares sagrados de nefastas passagens, foram outrora templos de orações e crença, repousando agora à margem dos nossos olhares, ignoradas e esquecidas.

Camilo Castelo Branco, nas Memórias do Cárcere, faz-nos a descrição desta mesma festividade, acrescentando-lhe aspectos de natureza social, hoje desaparecidos.
Porque a descrição que ele nos faz é tão peculiar, transcrevemo-la para que se delicie com ela e conheça melhor esta festividade.
"É de saber que Luis Lopes, António Manuel e José Vieira, que ainda vive, foram, em anos verdes, três denodados jogadores de pau, e tamanho terror incutiram nas cercanias de Fafe que bastaria a qualquer deles, para vencer a sua, mandar o pau e não ir, como o rei da Suécia fazia às botas.
As mais memorandas façanhas dos Vieiras tinham o seu teatro na celebrada romaria da Senhora de Antime. Aí apareciam os três campeadores mascarados, como era de uso em mancebos de famílias de alto porte. As máscaras afiavam as chanças de outros chibantes, e deste gracejar de mau agouro procedia o partirem-se as caras por debaixo das máscaras, como se as não quisessem para outro mister, ou as sacrificassem à padroeira da romagem, como os índios se estiram sob as rodas das carroças dos seus ídolos.
A Senhora de Antime é de pedra, e pesa com a charola vinte e quatro arrobas. Os mais possantes moços da freguesia pegam ao banzo do andor. Aconteceu, há anos, ser um dos que puseram ombro ao andor mal visto dos outros, e de um principalmente. Ao dobrar de uma esquina o moço odiado sentiu-se vergar sob as vinte e quatro arrobas de pedra, e morreu instantaneamente esmagado.

O principal inimigo do morto foi logo conhecido, e varado por uma choupada, que lhe fez espirrar o sangue e a vida à charola da imagem. Tirem disto a limpeza de consciência e religiosidade daqueles sujeitos, que ali vão dar testemunho de seu fervor, com a Senhora de pedra aos ombros!»

. . . A FESTA E A MESA . . .


Neste local do Minho Interior, onde termina o Litoral e começam as terras do Marão e do Barroso, as festas têm as cores alegres do Minho e a mesa espelha o povo que as faz.
A castanha desapareceu das mesas, mas ficaram os gestos festivos da matança do anho para as festas da Senhora de Antime, realizada no 2º Domingo de Julho, e do cabrito nos tempos Pascais. Para as Feiras Francas de 16 Maio, a vitela assada oferece o seu especial paladar e o vinho verde, sempre presente, ritualiza cada um dos momentos com a dignidade de uma dádiva divina.
Em todas elas, as cavacas e o pão-de-ló dão o colorido doce e festivo às mesas largas, nestes momentos que marcam o tempo e repetem ciclos próprios de sociedades «primitivas».
Mas, de entre todas as festas locais, a da Senhora de Antime é a que possui a magia maior.
As mais antigas referências escritas sobre as festividades da Senhora de Antime aparecem nos finais do séc. XIX. Hoje, esta festividade corresponde também às Festas do Concelho que, com a Feira Franca em 16 de Maio, constituem ainda as manifestações populares mais significativas do concelho.
O momento mais significativo das festividades da Senhora de Antime é a procissão. Esta, saíndo de Antime em direcção a Fafe, é recebida pela da Nossa Senhora das Dores nos limites das duas freguesias, dirigindo-se as duas procissões, aí transformadas numa só, para a igreja Nova de São José ou da Misericórdia.
Recordamos a descrição feita por Pinho Leal na Corografia Portuguesa, de 1880, onde nos é relatada a mais bela romaria de Fafe.
"Grande romaria a Nossa Senhora d'Antime ou Senhora da Misericórdia, ou do Sol. A imagem é de pedra, e com a charola pésa 24 arrobas!
Outros dizem que a senhora pésa 8 arrobas, e o andor, que também é de pedra (!) outras oito. Levam-na na procissão os maiores valentões da freguezia.

A imagem da Senhora é de granito metamorphica, com braços postiços e sem pernas nem pés, nem feitio algum de gente, além da cara. São 8 rapagões que levam a charola e a senhora, mas vão outros oito para os revezar. Apesar da sua valentia, por varias vezes teem alguns ficado esmagados debaixo da imagem; mas, mesmo assim, ha grandes empenhos para levarem a charola, porque teem fé de serem bem succedidos, nos seus casamentos, se tiverem sido conductores da santa.»

... FILANTRÓPICO...


No contexto da filantropia, são identificáveis, em Fafe, o Hospital de São José e dois outros imóveis onde funcionaram os asilos de “Infância Desvalida” e de “Inválidos”, como expressões da acção benemérita do séc. XIX.
O edifício do Hospital (1860) deve a sua construção ao financiamento dos “Brasileiros de Torna – Viagem”, sendo uma réplica arquitectónica de outro, existente no Rio de Janeiro e propriedade da Sociedade Portuguesa de Beneficência dessa cidade (1853).
A participação pessoal e financeira dos emigrantes de "Torna - Viagem" na criação das primeiras agremiações de natureza social, verifica-se também na constituição da Irmandade de São José, datada de 21 de Março de 1862. Nela têm assento como provedores e mordomos, fazendo-se representar em retratos a óleo de grande formato, o que constitui outra das expressões de visibilidade simbólica do seu prestígio e estatuto social.
A construção do edifício do Hospital de São José ou da Misericórdia (iniciada em 1859 e inaugurado em 1863) é produto da estreita ligação dos ausentes no Brasil com os residentes na Vila de Fafe, surgindo na cidade do Rio de Janeiro uma comissão de subscritores para angariação de fundos para a construção do Hospital na terra natal, composta por Bernardo Ribeiro de Freitas, Luís António Rebelo de Castro, Leonardo Ribeiro de Freitas, Comendador Albino de Oliveira Guimarães, Comendador José António Vieira de Castro, José António Martins Guimarães, António Joaquim de Castro, António Joaquim da Silva, Agostinho Gonçalves Guimarães e António Gomes de Castro, tendo como presidente o Comendador António Gonçalves Guimarães, comissão essa que conseguiu, numa primeira subscrição, angariar cinco contos de reis.
Em Fafe, uma outra comissão, constituída por Dr. Florêncio Ribeiro da Silva, António Leite Lage, José Florêncio Soares, Miguel António Monteiro de Campos, sendo os três últimos emigrantes de retorno definitivo bem sucedido, tinha como obrigação edificar o Hospital de Fafe.
A construção dos Asilos de Inválidos de Santo António e o da Infância Desvalida, foi promovida, respectivamente, por Manuel Baptista Maia, em 1906 e António Joaquim Vieira Montenegro, também emigrantes do Brasil, tendo este rico comerciante do Brasil deixado em testamento, de Janeiro de 1874, 15.300$000 reis, a favor das meninas pobres do concelho e 7.600$000 reis para uma escola de instrução primária em Travassós.
«A irmandade da misericórdia foi instituida a 23 de março de 1862, mas a primeira pedra do hospital de S. José, que ela administra, foi lançada a 6 de janeiro de 1859, e em 19 de março de 1863 foi aberta aos pobres. É um elegante e vasto edifício, em optimas condições.
Foram seus fundadores José Florencio Soares e outros negociantes d'aqui, estabelecidos no Brazil. Os estatutos, foram feitos em 23 de março de 1862.
O povo d'aqui também concorreu muito para esta obra. A sua receita ordinaria é de 829$772 rs. e a extraordinaria de 432$363 rs. A despeza obrigatória é de 776$472 rs, e a facultativa de 379$114.
Ainda são precizos 16 contos de reis para a conclusão d'este estabelecimento de caridade, que nos primeiros trez annos já tratou 210 doentes.

Os poderes publicos, longe de subsidiarem e procurarem o seu desenvolvimento, teem procurado varios meios de o prejudicarem e embaraçarem. É seu actual provedor (o 1º) o sr. José Florêncio Soares.»

...A CULTURA…


O Teatro-Cinema, inaugurado em 10 de Janeiro de 1923, constitui um exemplar arquitectónico único em Portugal, pelo facto de possuir uma fachada pintada.
Com capacidade para 400 lugares distribuídos pelas frisas, camarotes e plateia, nele se pode ver fosso de orquestra e um palco de dimensões significativas, bem como tecto abobadado e pintado.
A sua construção deveu-se à iniciativa de José Summavielle Soares, neto do “Brasileiro” José Florêncio Soares, emigrante do Rio de Janeiro.
Numa terra onde já havia uma Sociedade de Recreio, um Grupo Dramático, um Grupo Musical e Teatro com Animatógrafo, o Teatro-Cinema completou o conjunto de elementos de cultura necessários à nova burguesia constituída, principalmente, por emigrantes do Brasil, a qual reproduziu nas suas terras de origem um estilo de vida que lá havia aprendido, assim como em viagens ao estrangeiro.
O Teatro-Cinema foi testemunha de acontecimentos sociais e políticos significativos e da actuação das mais importantes figuras do teatro da época. Nele se fizeram as primeiras projecções de cinema.
Foi adquirido pela Câmara Municipal em 2002 e aguarda intervenção para a sua reabilitação.


ARQUITECTURA E OS PORMENORES


Na segunda metade do século XIX e primeira metade do XX, os emigrantes de retorno edificam em Fafe as suas habitações, definindo um recorte arquitectónico original e uma estrutura urbana de novas ruas e praças, à imagem das que conheceram do outro lado do Atlântico e que lhes deu a fortuna.
As casas particulares, construídas por emigrantes do Brasil, surgem no centro cívico de Fafe, entre 1860 e 1930 e, pelas suas características arquitectónicas particulares, vieram a ser designadas por "Casa do «Brasileiro»”.
Nesta perspectiva, algumas edificações (o palácio, a casa apalaçada vertical ou horizontal e o palacete) remetem para um quadro de leitura urbana da “Casa do Brasileiro”, como expressão de representação simbólica de retorno.
Na arquitectura e decoração das fachadas das casas rebocadas e caiadas, ou cobertas com azulejos, estão presentes as cores do Brasil, os beirais de faiança, as varandas estreitas com guardas de ferro forjado ou fundido, ricamente ornamentadas, as platibandas decoradas, os lanternins, as clarabóias e as estatuetas, rematando as edificações.
No interior, pode observar os átrios decorados com azulejo, as escadarias de madeiras preciosas, os tectos de estuque (de influência inglesa), as portas e as janelas altas encimadas por bandeiras com vitrais coloridos, os lustres de cristal, os delicados móveis e porcelanas e nas paredes, bilhetes-postais com vistas do Rio de Janeiro, oleografias e litografias coloridas. O piano e o bilhar completam a teatralidade da figura do "Brasileiro" e do seu tempo.
Este olhar minucioso dar-lhe-á a conhecer a arquitectura e a elegância decorativa de um tempo recente, já muito destruídas pelas novas construções e a sensibilidade de quem cuida do desenho e decoração da cidade.
Do espaço público desapareceram, entretanto, os fontenários em ferro fundido e os mictórios implantados mesmo no meio da Praça.

As guardas de ferro, que acompanhavam a Arcada regressaram…, mas não regressam mais alguns dos mais belos imóveis que ruíram à força do martelo e que hoje apenas pode ver em postais ilustrados

O SÉCULO XX


Na primeira década do século XX assiste-se à decadência do "brasileiro" com a inesperada perda de valores no mercado da borracha brasileira, provocada pela concorrência das colónias inglesas asiáticas.
Ao mesmo tempo, a nossa participação na Primeira Guerra Mundial (assinalada com um monumento na Praça 25 de Abril), contribui negativamente para a economia local.
Por sua vez, a depressão económica mundial de 1929, conduzindo à falência dos Bancos e outras instituições financeiras, provocou dificuldades irreparáveis, não só nos capitalistas locais, todos "Brasileiros" ou seus descendentes, mas também no fluxo dos proventos dos que viviam no Brasil.
Posteriormente, durante o Estado Novo e logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, verifica-se um surto de emigração para a Europa com evidentes reflexos nas iniciativas de investimentos na construção civil.
A guerra colonial vai incrementar a "emigração a salto" para a Europa, assistindo-se, simultaneamente, à decadência agrícola e industrial.
Porém, nessa altura, na década de sessenta, a cidade começa a dar novamente sinais de actividade com obras públicas da iniciativa do Estado Novo. É o caso da construção do Tribunal, a remodelação dos Paços do Concelho (alterando-lhe profundamente a fachada), a construção do edifício dos Correios e algumas casas dispersas que utilizam uma linguagem arquitectónica de alguma sobriedade típica do modernismo português.
Nos finais da década de setenta, assiste-se à construção de imóveis no tecido urbano pré-existente, alterando significativamente a imagem da cidade, devida ao afluxo das divisas entradas em Portugal por intermédio das emigrantes na Europa.
Posteriormente, a abertura das Avenidas das Forças Armadas e Avenidas do Brasil, a construção dos Parques Porto Seguro, em são Gemil e da Cidade, em Sá, definiram novos espaços estruturantes da cidade.
Hoje, o antigo centro cívico apresenta-se reformulado, mostrando, no mobiliário urbano, antigos referentes simbólicos, particularmente na Praça 25 de Abril e ruas adjacentes.
É o início de uma viagem que pode conter uma outra atitude face ao passado…

Este texto teve como base a seguinte bibliografia do autor:
MONTEIRO, Miguel, “Cultos e Ocultos de Monte Longo”, separata - Minia, Braga, 1995, PP.103-135.
MONTEIRO, Miguel, Fafe dos "brasileiros" (1861)-1930) - Perspectivas histórica e patrimonial, Fafe, ed. de autor, 1991
MONTEIRO, Miguel Teixeira Alves, Migrantes, Emigrantes e “Brasileiros” (1834-1926)- territórios, itinerários e trajectórias, Braga, Instituto de Ciências Sociais, Universidade do Minho, 1996.
MONTEIRO, Miguel, “O Jogo-do-pau como representação de estatuto e hierarquia social”, Mínia, Braga, 1997
MONTEIRO, Miguel, “Marcas da Arquitectura de Brasileiro na Paisagem do Minho,” O Brasileiro de Torna Viagem, CNCDP - Portugal, Comissão Nacional para as comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Lisboa, 2000
MONTEIRO, Miguel,, “O Público e o Privado”, O Brasileiro de Torna Viagem, Lisboa, CNCDP – Portugal, Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, Lisboa, 2000

MONTEIRO, Miguel, Migrantes, Emigrantes e “Brasileiros” (1834-1926), Fafe, Ed. autor, 2000.